Na rua do poeta sem palavras, há uma árvore podada
À primeira vez, quando eu cheguei por
esses lados da cidade, que fica às costas de onde eu praticamente nasci, olhei para
cima sem a pretensão de demarcar os lugares das estrelas e das árvores no céu.
O tempo passou e, aos poucos, fui construindo o meu segundo olhar, já se
acostumando com as fixações das raízes e os efeitos ilusórios das oscilações
luminárias; por onde caminham as nuvens? Devem estar em dias mais ou menos férteis
em atenção e aquarelas. Mas hoje, ao me deparar com o terceiro elemento da
tríade de meus olhos, percebi que os cabelos verdes e os longos dedos
amadeirados de uma das árvores da rua foram arrancados. Talvez os meus ouvidos,
mais cedo, estivessem a escutar as lamentações do meu próprio peito no momento
em que houve os gritos e os choros da Natureza; então, por isso, não foi apenas
eu que outra vez olhei para dentro do céu, mas a altura também me olhou e me
descobriu tão egoisticamente. Não para me redimir, mas por uma razão
irracional, eu tracei uma linha que seguia o infinito e me perguntei se, do
outro lado dessa sensação, existiria alguém traçando uma linha noutra direção
que se encontraria com a minha, formando um ângulo de valores preciosos e
sinceros. As nuvens agora voltavam a navegar por aqui e pelos bonitos desenhos
que formam, logo imaginei que haveria alguma coisa além de eu mesmo; deixei a
minha visão para encontrar a visão de um alguém, mesmo que tal busca seja para me encontrar
no meio disso tudo, porque da mesma maneira que uma árvore sem suas copas é uma
incompletude de existência, o poeta sem palavras é uma solitude última: nada
mais ele tem, nem a companhia de si.
Adeus foi o que eu disse ao agora. É
claro que só neste presente é que as letras formaram esse sentido, porque ao
acontecer, soou como se o passado tivesse me abraçando de surpresa na forma de
canções familiares à minha raça. Tornei-me a fronteira de mim mesmo. Quem sabe,
eu ainda seja o céu para aqueles alguns de mim que estão enterrados sob a pele
morta, porque por mais que eu queira dizer disto que me encara lá de cima,
acabo sempre caindo no mais profundo eu. Quem sabe mesmo, um dia, eu consiga
alcançar o alto e ver que o este é o aquele e descobrir, finalmente, que aquele
era você, que me observava através da interseção dos infinitos.
(Olá é o que eu digo ao agora. Nada disso
deve ter importância, eu posso simplesmente estar um pouco cansado... O cansaço
é a tristeza do corpo, quando a alma já está avessa ao seu molde. Então, prometo
descansar quando a paisagem voltar como estava e a árvore crescer como manda o
seu destino, reivindicando o seu lugar no céu, perto das estrelas).
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