Acordado, de olhos fechados

"Le pèlegrin" de René Magritte

Os meus dias seguintes são sempre melhores
nas noites anteriores,
quando minha cabeça pende no fio fino e quente
de um travesseiro velho e costumeiro.

Lá, quem me acorda é o sol
com o seu jeito afeminado que,
pela fome de todos os lugares e de todas as coisas,
naturalmente faz as vezes de mim aqui.

Lá, os meus ossos não são feitos de pele.
Quanta força eu tenho acordado e de olhos fechados!
Imaginando a dureza dos sonhos gelatinosos
que se cruzam, me tendo como intersecção. Aqui

os compassos se descompassam
debochadamente:
nos manuseios, nos voos, nos batimentos
do coração –– já desidratado lá entre o vigésimo quinto e
o vigésimo sexto andar
desse corpo ––, no balançar dos cabelos –– que
se jogam linha-a-linha por todos os recantos de um abismo sem volta ––, mas

quando minha cabeça pende no fio fino e quente
de um travesseiro velho e costumeiro,
os meus dias seguintes são sempre melhores
nas noites anteriores.

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