Convite
Era quase meio-dia quando ele entrou
sozinho no restaurante. Tinha ficado algum tempo do lado de fora pensando se
entraria ali ou não; sabia que não era tão fácil assim, ao menos não para ele.
O restaurante não era de luxo, mas tinha um certo requinte, talvez vindo do
clima caseiro do lugar: era amplo, as mesas redondas, que estimulavam mais a
sociabilidade, se espalhavam com um razoável espaço entre elas – se as pessoas
em suas mesas conversassem sem muitos exageros, não era possível ouvir os
assuntos uma as outras; as paredes eram constituídas de alaranjados tijolinhos,
o chão era de uma madeira lisa e duas grossas colunas se erguiam no meio do
ambiente. Como sempre fazia nas vezes em que ia nesses lugares onde precisava
sentar, já sabia que escolheria o fundo, longe daquela grande porta expositora,
só precisava achar o lugar certo... A última mesa do canto direito, como
nenhuma outra dali, parecia se interessar pela sua companhia; sentou-se e descansou
suas coisas na cadeira ao seu lado. Àquela hora, o restaurante estava
praticamente vazio; sem ver o garçom, decidiu mexer no saleiro enquanto o
esperava surgir de alguma direção qualquer. Além de sua língua agradecer pelo
salgado sabor, ele mesmo gostava muito de sal, que lhe acalmava a alma
incomodada pela demora do garçom... “Ele vai aparecer”, pensava. “Ele tem que
aparecer!”. Eis, então, que surge o esperado recepcionista: apresentou-se e
entregou-lhe o cardápio, mas ele nem fez questão de olhar, nem os itens, nem os
seus preços; pediu logo dois refrigerantes, não porque alguém lhe faria
companhia em breve, mas por saber, observando a movimentação do local, que ali
encheria depressa e ele não queria ficar gritando o garçom para pedir mais
alguma coisa.
Passaram-se alguns minutos até a vinda dos
seus pedidos; o relógio do restaurante já marcava meio-dia e quinze. Teria mais
quinze ou vinte minutos para tomar suas bebidas e pedir a sua comida; durante
esse tempo, pensou e repensou sobre os pesados acontecimentos do seu dia e da
sua vida e notava as informações e detalhes novos que surgiam junto com as muitas
pessoas que se propunham a ficarem ali. Apesar de muito diferentes, todos os
convidados do Acaso para estarem ali, naquele momento e recinto, estavam
acompanhados, sejam por amigos, colegas de trabalho ou namorados. As ondas
geladas pareciam pontes para uma reflexão mais profunda...
O ponteiro maior do relógio se alinhava
ao número seis. Os olhos dele atravessaram por todo restaurante a procura do garçom
e, ao encontrá-lo, o seguiu para que talvez a verde sorte se atraísse pelo
verde do seu olhar; por vezes, a súplica apalavreada desse tipo de pessoa é acolhida
e rapidamente o garçom atendeu aquela perseguição um tanto desesperada e o sutil
balançar de cabeça. Para o seu alívio, o seu pedido de almoço foi anotado sem
muitas delongas e agora só restava aguardar.
Na espera, ele se fixou nas figuras que
se movimentavam: riam, se namoravam, conversavam, como se os dentes não
travassem, a língua não enrolasse e a garganta não desse um nó. Quis entender
aquilo, como eles conseguiam... Mas ele sabia que nunca agiria assim, que nunca
seria tão fácil para ele se amigar, gargalhar, beijar como eles; nunca falaria
coisas sem cuidado, descuido esse que fariam as pessoas rirem mais, conversarem
mais e se namorarem mais.
Para ele, ir a um restaurante sozinho
sempre pareceu muito triste; hoje, suas dúvidas foram todas confirmadas. O
prato cheio e colorido pousou diante dele como se estivesse flutuando, de tão
desatento estava para perceber o garçom. Ele olhou para o relógio – meio-dia e
quarenta –, colocou uma porção de comida no garfo, visualizou outra vez as
tonalidades que formavam aquele quadro e comeu, ao mesmo tempo em que chorava
em silêncio.
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